quinta-feira, 11 de outubro de 2007

Sarah Lee em Nova york

Lendo a revista Time Out New York (timeoutnewyork.com, mas existe em outras cidades grandes americanas), ou simplesmente Tony, edição de 4 a 10 de outubro de 2007, eu, um carioca esperto e safo, me senti uma velhinha republicana e virgem do meio-oeste.

Para quem quer saber o que rola na cidade (a dica foi do Jimmy), a Tony é muito útil: é uma revista semanal, na linha Veja Rio, só que é vendida, por três dólares, e tem o dobro de páginas. É grande porque traz a mesma programação cultural, completa, em pontos de vista diferentes – dividida por seções, por público alvo, por bairro ou por dia da semana. Fora isso, a revista tem um tema principal, e o daquela semana era sexo. Não se deve perder de vista que não se trata de uma revista para um público especializado, como uma Playboy, mas para todos que se sintam incluídos entre os nova-iorquinos modernos e antenados. Seu público alvo parecem ser as classes mais abastadas, na faixa dos 20 aos 50 anos, portanto era de se esperar que tratasse do tema sem grandes pudores, assim como esperaríamos no Brasil, mas a edição em questão vai bem além dos similares nacionais.

A capa da revista já promete debater não a xaropada de "discutir a relação", diferenças entre os homens e mulheres ou “como recuperar seu namorado em três dias”, mas sim as fantasias sexuais, e de forma mais explícita possível. Também não se trata de temas proibidos e misteriosos como homossexualidade, pois Nova York já passou faz tempo dessa idade – a Tony tem uma seção totalmente dedicada aos gays e lésbicas, da mesma forma que tem uma para crianças; aliás, esta vem em seguida daquela. O negócio é mais embaixo, ou por outra, é em cima E embaixo, depende do freguês.

Para começar, a revista publica alguns relatos de novaiorquinos que vivenciaram suas fantasias. Audacia Ray, que andava entediada com sua vida de sexo grupal, narra sobre a noite feliz em que foi duplamente penetrada, isto é, penetrada ao mesmo tempo (DP para os íntimos, muito íntimos), pelo namorado e uma amiga do namorado, como ilustra a foto acima, tirada da própria revista. Em outro relato, Samantha Jones, estressada com assuntos de dinheiro e carreira, queria porque queria experimentar um “splosh”, ou seja, sexo lambuzado com alimentos. Na dúvida sobre o que usar, ela e seu namorado foram ao supermercado e compraram pudim de baunilha e espaguete com molho de tomate, descartando o chocolate e o chantilly por serem muito clichê. Como se pode imaginar, a trepada foi desastrosa, mas o casal conseguiu obter boas risadas e um quarto imundo ao final da experiência. Zippy Reynols queria fazer sexo em público, e o fez, num campo de baseball, às duas da manhã, com alguém que conheceu num bar. Tess Danesi queria ser estuprada, e combinou tudo com o namorado, mas ele o executou com tanta veracidade que ela ficou com medo dele. Kay Poison, por sua vez, queria apanhar, ser chicoteado e humilhado por uma fêmea em um ritual sadomasoquista, e para tal contratou Mistress Coraline. A lésbica Pamela Marks queria transar com uma prostituta transsexual. Alpinia Dean fez sexo com sua bicicleta. As histórias são ilustradas por fotos picantes, enriquecidas por comentários de James Bufalino, hilariante comentarista sexual da revista.

A revista prossegue, relacionando então alguns fetiches numa tabela de duas páginas, com perversões em linhas, e nas colunas, pequenos textos sobre o que é tal fetiche, como começar, quais são os riscos e dicas de quem já o pratica. Alguns exemplos são tara por pés, ou por “hentai” (qualquer pornografia na forma de desenho em quadrinho, principalmente japonês), brincar de médico, sexo por telefone, prazer com eletricidade e o “controle da respiração”, que é aquela coisa de colocar saco plástico na cabeça para obter maior prazer sexual, cujo maior risco é, obviamente, morrer (como o público alvo deste blog é talvez mais amplo que o da revista – em outras palavras, minha mãe o lê - exerci aqui meu direito reprimido de censor).

Em outra página, são analisados os resultados de uma pesquisa sobre as preferências do nova-iorquino, divididos em quatro grupos (homem heterossexual, mulher heterossexual, homem homossexual e mulher homossexual), que responderam perguntas tais como: se você fosse convidado para ser um personagem numa “brincadeirinha”, qual seria sua preferência? (opções: policial/bandido(a), médico/paciente, entregador de pizza/cliente, presidente/secretário(a) de Estado); complete a frase “minhas fantasias sempre envolvem...” (opções: múltiplos parceiros, pessoa do mesmo sexo, brinquedos sexuais, ânus); se você ficasse invisível de repente, que local você gostaria de ir para uma sessão de voyerismo? (opções: o banheiro de um colégio de segundo grau, o quarto de dormir de Brad Pitt e Angelina Jolie, vestiário de academia de ginástica, set de filmagem de filme pornô) etc. Daí para baixo, bem para baixo.

Crônicas e colunas seguem, entram as seções e o assunto não se extingue: a seção sobre gastronomia, uma matéria sobre como os chefs de cozinha (que são popstars em NY) sabem que os animais que usam em seus pratos foram felizes, inclusive se tiveram uma boa qualidade de vida sexual. As soluções passam por monogamia entre porcos, vaginas artificiais para bois, por aí. Na parte sobre bares, a revista indica locais onde se pode jogar Erotic Photo Hunt, um game em que o jogador tem que olhar uma seqüencia de fotos eróticas, apresentadas duas a duas, uma ao lado da outra, e dizer se existem diferenças entre elas. Mais adiante, leitores viciados em pornografia comparam tecnologias de HDTV. Página seguinte, uma reportagem sobre um loja de produtos para sadomasoquismo. Outra seção, intitulada The Nether-lands, começa assim: “Cinco ou seis anos atrás, meu ex me pediu uma ‘brasileira’ como presente do dia dos namorados. Eu fiquei indignada, pois não queria ficar igual a uma estrela pornô ou, pior, uma criança!” A ‘brasileira’, no caso, significa uma depilação total dos pêlos pubianos, e a reportagem é sobre isso. Termina com gráficos em pizza sobre os hábitos dos nova-iorquinos no que se refere a depilação. E por aí vai: uma matéria didática sobre como fazer sexo oral, detalhes de uma viagem de um senhor a um resort na Virgínia do Norte, onde ele desfrutou de uma prostituta, entre outros prazeres, com tudo pago pela Tony. Todos os textos são acompanhados por fotos e dicas de sites, e também há propagandas diversas, de vibradores, pontos de encontros de solteiros que desejam conhecer moças e/ou rapazes russas, judeus, europeus em geral, enfim...

A revista parece assim participar de um esforço contínuo que o nova-iorquino faz para se diferenciar, liberar-se das repressões e respeitar as diferenças, mesmo as mais bizarras, levando adiante a filosofia do ultra-politicamente-correto. Uma das coisas que chamam atenção nos EUA é sua busca incessante por ser “o mais” – o país mais livre, o mais rico, o mais forte – e essa obsessão é chuchada diariamente na mente de cada um dos americanos. Assim, Nova York não quer apenas se libertar sexualmente, quer demonstrar que é – e parece ser mesmo – a cidade mais democrática do mundo. Temos que ficar de olho, pois essa mixórdia daqui é um laboratório único e muito interessante sobre a humanidade pós-moderna. O que não impede que eu, Sarah Lee, fique chocada.

(Para finalizar, uma contribuição à feticharia, que aprendi num livro de história sobre nossos antepassados portugueses: a expressão “afogar o ganso” não é metafórica, mas literal – costume dos patrícios de comer o cu do ganso enquanto sua cabeça é afogada numa bacia d’água. Segundo consta nos registros, dá um grande prazer – não para o ganso, claro.)

2 comentários:

Claudia Tojek disse...

Eu quero ver um comentario de minha mae aqui.

denise disse...

Ah... MAs eu também quero. Vamos chamar todas para comentar a notícia fofa?